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Calasans, o patrono de Canudos

Publicado sexta-feira, 31 de julho de 2015 às 08:34 h | Autor: Edivaldo M. Boaventura | Educador, professor emérito e membro da Academia de Letras da Bahia | [email protected]

Neste centenário de José Calasans, indaguemos como o historiador chegou à problemática de Canudos. Calasans deixou claro quando afirmou: "cheguei a Canudos não por intermédio da história, mas pelo folclore". Como afirmou várias vezes até 1950, predominava o ponto de vista de Euclides da Cunha, nas páginas vibrantes do "livro vingador". O sucesso de Os Sertões suplantou todos os outros autores e ultrapassou os limites nacionais. Há uma maneira euclidiana, mas existe um outro olhar sobre Canudos, para o qual Calasans muito contribuiu. Criou uma atitude positiva a respeito de Antônio Conselheiro. Foi mais além, do ponto de vista sociológico, quando identificou vários tipos profissionais: beatos, combatentes, negociantes, proprietários e outras figuras do Belo Monte.

Para análise da sua contribuição à historiografia de Canudos, é preciso considerar alguns posicionamentos. A sua condição de historiador, de um lado, e de estudioso do folclore, do outro, combinaram-se na abordagem de Canudos. Existe, como sempre se considerou, a obra de Euclides da Cunha, mas há também Antônio Conselheiro e o núcleo central de toda a problemática - Canudos.

Conjecturemos, Euclides da Cunha com a sua brilhante obra imortalizou Canudos, o que nos leva a indagar: e se não fosse Euclides da Cunha, o que teria sido de Canudos?

Sempre me faço essa indagação quando vou ao Parque Estadual de Canudos. Considerando que houve outros conflitos bélicos, a exemplo da Guerra do Contestado, mas que não possuíram a relevância social e histórica de Canudos. Para o crítico Wilson Martins: "Canudos se eternizou por causa de Os Sertões, bancado por Euclides."

Nesse conjunto de circunstâncias, consideremos a figura carismática de Antônio Conselheiro, acrescida de novas achegas por José Calasans. Pois bem, ao longo dos anos não esquecer o seu ponto de origem que foi a prática antecipada da história oral e do cotidiano, bem como a crônica dos vencidos.

Assim, desse cruzamento de variáveis surgem os resultados da investigação sobre o problema Canudos. Calasans visitou os sertões da Bahia inúmeras vezes, confirmando o seu intento de fazer história a partir do interior e não tão somente da capital e seu Recôncavo.

Em uma semana cultural em Canudos, Calasans descreveu as três Canudos. A primeira foi destruída pelo fogo, arrasada completamente pelas tropas republicanas. A segunda, inundada pelo açude que represou as águas do rio Vaza Barris. E a terceira, a atual, a Canudos que se ergueu às margens do lago de Cocorobó. Era dessa maneira que ensinava, informalmente, com suas conversas descontraídas, atraentes e ricas de sabedoria.

É oportuno evidenciar a forma como escreveu a saga de Canudos. A partir da tese - O ciclo folclórico de Antonio Conselheiro - foi redigindo artigos, capítulos, seções, aspectos, tópicos, quase-biografias, prefácios, approaches sobre as relações triangulares: Euclides da Cunha, Antônio Conselheiro e Canudos.

O que existe de sumamente importante é o contributo de Calasans. Diríamos que ele criou um novo paradigma para a encarar Canudos. Nesse seu centenário, podemos avaliar a relevância de sua obra e perceber o direcionamento do seu pensamento na continuação dos estudos por veredas e sendas por ele abertas.

Em suma, José Calasans tornou-se um disseminador do conhecimento de Canudos, contextualizado na cultura do sertão. Grupos de pesquisadores, estudiosos, escritores e artistas seguiram a sua orientação e continuaram a escrever, a investigar e a publicar. De tudo isso, resultou um conjunto magnífico de publicações, teses, ensaios, romances, poemas, músicas, pinturas, desenhos e até construções que fazem de José Calasans um patrono de Canudos (www.josecalasans.com.br).

E. BOAVENTURA ESCREVE 6ª-FEIRA, QUINZENALMENTE

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