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"A doença não é necessariamente algo ruim"

Publicado segunda-feira, 03 de abril de 2017 às 10:57 h | Atualizado em 03/04/2017, 11:01 | Autor: Kátia Borges
Raquel Minako levou a técnica do thetahealing para o posto de saúde do Vale do Capão
Raquel Minako levou a técnica do thetahealing para o posto de saúde do Vale do Capão -

Brasileira de origem oriental, a paulista Raquel Minako, 29, buscou na educação – é formada em pedagogia pela Unicamp – e na dança contemporânea expressões para o desejo de exercer plenamente todo o seu potencial. Mas foi mesmo como terapeuta holística e corporal que conseguiu unir as duas vocações. Em Israel, onde viveu e conheceu seu marido, o também dançarino e terapeuta Ron Oren, ela descobriu o thetahealing, técnica de cura criada nos anos 90 pela norte-americana Vianna Stibal. Tornou-se então especialista nessa ferramenta, que utiliza as ondas cerebrais theta no desbloqueio da chamada “crença-raiz”, aquela que frequentemente nos impede de alcançar a cura e a felicidade por atuar em níveis inconscientes. “Noventa e cinco por centro do que pensamos é inconsciente”, diz. Ainda pouco difundido no Brasil, o thetahealing a levou ao Vale do Capão, na Chapada Diamantina, onde ministrou cursos e decidiu morar com a família. “Foi um chamado da espiritualidade”, diz. A escolha, como ela conta, deu-se em função do ambiente essencialmente comunitário e do contato com a natureza. Na região, além de cursos avançados de formação em anatomia intuitiva, Ron e Raquel realizam atendimentos gratuitos no posto de saúde da região, há um ano, em um projeto que visa atingir principalmente os nativos, que não têm recursos para pagar as consultas. “A transformação é individual, mas só mudando individualmente as pessoas conseguiremos mudar a nossa sociedade”, diz. Em Salvador, onde ministrou palestra sobre o tema, Raquel conversou com Muito sobre o modo como a medicina tradicional tem se relacionado com as terapias holísticas.

Pouca gente em Salvador conhece o thetahealing, mas no Vale do Capão, na Chapada Diamantina, esta técnica de cura tem sido oferecida gratuitamente no posto de saúde local. Como surgiu esse projeto e como ele tem sido aceito pela comunidade?

Trata-se de um projeto que envolve vários terapeutas e que elaboramos após a conclusão do curso de anatomia intuitiva, que é um curso avançado e profissionalizante que ministramos, eu e meu marido [Ron Oren, ex-dançarino israelense especializado em thetahealing]. Foi baseado no sonho de expandir a cura dentro do Vale, especialmente para os nativos, que têm menos acesso a essas ferramentas. A proposta foi aprovada pela equipe do posto de saúde do Capão, que é considerado modelo na Bahia e que tem o médico naturopata Áureo Augusto, que é uma pessoa incrível e realiza um trabalho lindo lá. Começamos atendendo os funcionários, para que eles pudessem conhecer nosso trabalho e atuar como multiplicadores, explicando à população o que é o thetahealing. Faz um ano que estamos lá e temos registrado 100% de satisfação.

Como é feito o atendimento no posto de saúde do Vale do Capão, e em que consiste, na prática, uma consulta de thetahealing?

São oferecidas sessões que duram, em geral, entre 30 e 45 minutos – mas, dependendo do dia e do fluxo de pessoas, elas podem se estender até uma hora ou um pouco mais – e são essencialmente faladas. Nesse sentido, elas acabam se parecendo muito com as sessões de psicoterapia, só que as nossas ferramentas são diferentes, pois vão por um caminho mais espiritual. Nós atendemos nas salas do posto e sempre às quartas-feiras. Muitas vezes chegamos a receber entre 10 e 12 pessoas a cada dia. Antes, as sessões eram realizadas apenas pela manhã, agora nós passamos a atender também pela tarde.

Está havendo uma demanda maior então?

Sim. Os resultados do tratamento têm sido bastante satisfatórios e há muito boca a boca na região. As pessoas querem mais. Há novos terapeutas nessa área também, que estão em processo de formação.

Geralmente, as terapias holísticas costumam enfrentar uma grande resistência da classe médica tradicional. Como tem sido esta resistência em relação ao thetahealing?

Penso que esta resistência depende muito de cada país, de cada local, e, sobretudo, do modo como as pessoas se relacionam com a medicina tradicional. Porque a medicina, na verdade, é feita pelas pessoas e para as pessoas. No caso específico do Vale do Capão, esta integração se dá de forma bastante tranquila, especialmente por conta do trabalho realizado por Áureo Augusto, que é um médico bastante aberto às terapias holísticas. Eu diria até que não há outro lugar no mundo, ou mesmo no Brasil, no qual a medicina tradicional seja tão aberta quanto naquela região, e foi essa abertura que tornou possível atendermos as pessoas gratuitamente e num posto de saúde público – em geral, os atendimentos são feitos apenas em consultórios particulares.

Em termos de difusão, esta terapia já pode ser considerada “mais popular” em nosso país?

Ainda não. O thetahealing ainda é relativamente novo no Brasil. Esta é uma técnica que nasceu nos Estados Unidos e, hoje, está imensamente difundida no Japão, especialmente no Japão, em Israel e em toda a Europa. No Brasil, ela começou a ganhar mais espaço nos últimos cinco anos.

Você é paulista e morou em vários países, entre eles Israel. O que te levou a fixar residência com sua família no Capão?

Um chamado da espiritualidade e, ao mesmo tempo, um convite. O Vale do Capão é lugar muito especial e reúne terapeutas de todo o mundo e de várias partes do país, é uma verdadeira ilha de cura. Eu e meu marido fomos convidados a dar um curso de anatomia intuitiva lá e decidimos ficar, porque encontramos ali o lugar perfeito para manifestar a realidade que queríamos, o nosso potencial, estando em contato com a natureza, com crianças, com suporte de outras famílias, de outras mães, o espaço ideal para nós.

Como podemos definir o thetahealing?

A melhor maneira de entender é experenciar (risos). Trata-se de uma técnica de cura energética emocional e física. Foi criada por uma mulher, uma norte-americana chamada Vianna Stibal, que há 20 anos conseguiu curar-se sozinha de um câncer na perna – um tumor com cerca de 23 cm – que a impedia de movimentar-se e que a levou a ser desenganada pela medicina tradicional, que deu a ela apenas três semanas de vida. Trata-se de conectar-se consigo e com o universo, Deus ou aquilo em que você acredita. Não é uma religião, mas um sistema que organiza as informações que temos sobre nós mesmos. Através dessa conexão, que se faz com a mobilização das ondas theta – aquelas que são sintonizadas durante o estágio do sono –, vamos tentar identificar quais são os bloqueios que impedem a nossa cura. Porque, muitas vezes, a pessoa quer a cura, mas inconscientemente ela não a deseja de fato. A verdade é que a doença traz alguns “benefícios” para o doente quando o coloca no centro das atenções ou se torna um pretexto para não viver a vida. Então é preciso desmontar essa idealização da doença para que a cura aconteça.

Nessa perspectiva, então, o que seria doença para os praticantes do thetahealing?

Nessa perspectiva, a doença não é algo necessariamente ruim, ao contrário. Ela pode ser algo até positivo para a nossa evolução enquanto seres humanos. A doença não é em si algo mau. Tudo vai depender de como eu vou me relacionar com ela, se vou ocupar uma posição de vítima ou se eu vou me transformar a partir da realidade que eu criei. Porque, para o thetahealing, todos somos coautores da nossa realidade e projetamos a doença, muitas vezes, como uma forma de aprender algo ou de curar questões que vêm dos nossos ancestrais. Trazemos em nós muitas marcas energéticas de nossos ancestrais.

Mas de que modo essas doenças de nossos ancestrais chegam até nós?

Algumas dessas doenças podem vir no nosso DNA. Por exemplo, muitos têm potencialidade para desenvolver um câncer, isso é absolutamente genético, mas nem por isso chegam a desenvolver. Tudo depende de como você vive, a qualidade da vida que você vive, isso já foi provado pelo campo morfogenético.

Você citou o processo de autocura de Vianna Stibal, e de como ela inaugura o thetahealing a partir dessa experiência pessoal. Há outros casos semelhantes de cura relacionados?

Muitos, há infinitos casos de cura, e de diversas doenças, desde mal de Parkinson a problemas de visão. Precisamos entender que, para o Criador, curar um resfriado e curar um câncer é a mesma coisa. Só que nós, como seres humanos, que hierarquizam e rotulam as coisas, consideramos a segunda cura como um milagre ou como algo inacreditável. Aliás, basta pesquisar sobre a ocorrência de milagres e você verá que eles sempre aconteceram e que nunca deixaram de acontecer.

O thetahealing opera apenas na cura do corpo físico ou atua também em curas mentais?

Atua sobre qualquer forma de bloqueio. Até porque as pessoas se autossabotam em diversas áreas – no amor, no dinheiro, na carreira profissional... Todos tendem a repetir inconscientemente padrões, é o cara que vive sendo demitido, a garota que vive sendo traída pelos namorados. Temos, por exemplo, um curso direcionado apenas aos relacionamentos amorosos, porque, no fundo, todas essas coisas estão conectadas.

Pelo que você diz, parece que a mente e o corpo vivem numa queda de braço.

É que tudo é energia. Você cria a realidade com o seu pensamento. Então o que fazemos, principalmente no começo do tratamento, é ver que pensamentos são esses e como eles estão bloqueando sua energia e sabotando sua vida. Noventa e cinco por cento de tudo aquilo que nós pensamos é completamente inconsciente, apenas cinco por cento é consciente. A física quântica já provou que tudo é energia e que a única diferença entre uma palavra dita e uma mesa de madeira está na velocidade com que os átomos se movimentam. Essa velocidade é que cria a ilusão de algo sólido. Todas as coisas sólidas são feitas de vazio.

Como o thetahealing atua no corpo humano?

Atua em um nível energético profundo. Há uma técnica que chamamos de escavação, em que fazemos perguntas aos pacientes que vão alcançando os seus diversos níveis de crença até chegar à “crença-raiz”, que é aquela que sustenta todo o sistema de crenças daquela pessoa. Por exemplo, há pessoas que preferem inconscientemente lidar com o fracasso e não com o sucesso, porque se sentem em dívida com seus antepassados. O que fazemos então é mudar esta “crença-raiz”.

E como se muda uma “crença-raiz”?

É um processo que pode ser longo ou não. Há vários caminhos. O boom do thetahealing no mundo acontece muito em função de se obter resultados muito rápidos. Explicando de modo mais simplificado, nós substituímos aquela crença negativa por outra, positiva, capaz de libertar a pessoa para que ela possa viver seu potencial criativo.

Funciona em casos de depressão, por exemplo?

Sim, porque a depressão está relacionada à autoestima e ao reconhecimento do próprio poder. Nesse caso, procuramos saber em primeiro lugar porque aquela pessoa escolheu a depressão – no thetahealing, sempre consideramos que cada um escolhe o que vive, ainda que essa escolha seja feita de modo inconsciente. O primeiro passo é entender como ela está se relacionando com a doença.

Você é pedagoga, além de dançarina, e foi professora da Faculdade de Educação da Unicamp. Como se relaciona hoje com as teorias acadêmicas?

Sempre digo que não tenho mais necessidade de ter todas as teorias para explicar a experiência, como a academia busca. Isso já não é importante para mim. Hoje, penso apenas na força daquilo que meu coração deseja. O maior medo do ser humano, por incrível que pareça, é ter sucesso. Teoricamente, pode parecer estranho, mas se você perguntar a alguém o que ele sentiria se fosse extremamente bem-sucedido, receberia respostas inacreditáveis. Em nosso inconsciente, ter sucesso muitas vezes equivale a fazer mal ao outro.

Mas o caos do mundo permanece em torno de quem se cura, não? Esse acaba sendo um caminho muito individual.

Sim, e essa questão tem a ver com nosso trabalho no posto de saúde do Vale do Capão. É um trabalho individual, sem dúvida, e o caos permanece, mas só assim podemos mudar o mundo. Se queremos transformar a sociedade, temos que começar por nos transformar em primeiro lugar, porque a sociedade é feita por pessoas. E esse é um processo que envolve, sobretudo, compaixão. 

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