475 anos: o que queremos para Salvador? | A TARDE
Atarde > Colunistas > Conjuntura Política

475 anos: o que queremos para Salvador?

Confira a coluna Conjuntura Política desta segunda-feira

Publicado segunda-feira, 01 de abril de 2024 às 07:00 h | Autor: *Cláudio André de Souza
Centro Histórico de Salvador
Centro Histórico de Salvador -

Em um artigo publicado em 1999 na comemoração dos 450 anos de Salvador, o sociólogo Gey Espinheira (UFBA) revela que “a cidade do futuro é também a cidade presente, que se faz cotidiana com a matéria do passado: essa é a razão da densidade cultural que impregna Salvador [...] Não se está em Salvador como em outro lugar, nela as pessoas estão sempre esperando que algo aconteça, e isto talvez seja a promessa de dizer ‘as cousas que estão por vir’.”

A Salvador colonial tinha a personalidade de um país (João José Reis), um ponto de apoio para a globalização da modernidade. Para Gey, “Salvador vai ser a cidade da esperança, não mais passivamente aguardando o acontecer, mas gerando revoltas [...] desde a Conjuração dos Alfaiates, em 1798, em que prisioneiros foram enforcados e decapitados [...] Veio a Rebelião dos Malês, em 1835; a tentativa de Independência de 1837, a Sabinada; conflitos e castigos. É a cidade à procura do futuro, querendo antecipá-lo e torná-lo contemporâneo dos desejos de seu povo.”

O nosso embarque na modernidade nos fez pensar uma cidade voltada para os interesses nacionais. Ao longo do século XX, ofertou lideranças políticas de diversos matizes ideológicos, dando ao país um líder de vocação autocrática como foi Antônio Carlos Magalhães (ACM) e deu também Waldir Pires, um republicano e democrata à frente do seu tempo.

Mas não estamos bem: nas últimas décadas o debate sobre o futuro de Salvador foi mesquinho, tecnocrático e insulado em conglomerados capturados pelo poder econômico do capital e da especulação imobiliária. Temos fracassado em propor novos pactos sociais e políticos em torno de uma cidade que não pode ficar mais amarrada à orla e ao “idilismo” de uma baianidade carlista resumida à figuração de uma “felicidade teleológica”, que no fundo invisibiliza as segregações espaciais e urbanas.

Queremos uma cidade com uma beleza de cores e nomes que teime em ser plural e diversa, mas que olhe para os grandes bairros e suas formas de sociabilidade. A cidade “do turista” que nos visita ao longo do verão não pode violar o imaginário social soteropolitano que habita por aqui os 365 dias do ano.

Precisamos ir além: rumo aos 500 anos, somos obrigados a organizar a cidade que queremos. De frente para o espelho, os governos e a sociedade civil devem levar políticas públicas à cidade histórica, mas também aos recantos contemporâneos, os bairros novos e os seus grandes conglomerados urbanos. Precisamos superar as desigualdades. Isso vai além do turismo de sol e praia, das nossas festas e do nosso carnaval. De que maneira, devemos priorizar a Salvador que nega as propagandas dos governos? O que precisa ser feito para revolucionar a educação do nosso povo? O que fazer para gerar mais empregos?

*Professor Adjunto de Ciência Política da UNILAB e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (UFRB) - [email protected]

Publicações relacionadas