Solar restaurado é reaberto em Santo Amaro | A TARDE
Atarde > Bahia > Salvador

Solar restaurado é reaberto em Santo Amaro

Publicado quinta-feira, 13 de setembro de 2007 às 21:56 h | Autor: Mary Weinstein, do A Tarde

O Solar Araújo Pinho, construído pelo conde de Subaé, na Rua do Imperador, um dos belos monumentos de Santo Amaro, passou de casa em ruína a imóvel devidamente restaurado em apenas oito meses. Esse tempo poderá servir de parâmetro para outras obras, porque foi considerado recorde para um trabalho de recuperação meticulosa de um patrimônio desse porte e importância: século XIX, feito com materiais importados e com detalhes trabalhados. Isso sem dizer que a degradação do imóvel, vendido pela herdeira Maria de Carvalho de Araújo Pinho à prefeitura há mais de 30 anos, se arrastava sem que providências fossem tomadas. O telhado tinha desabado e a sustentação já tinha esgarçado paredes e pilastras.

A obra duraria mais alguns meses, mas foi apressada para coincidir com as comemorações pelos 100 anos de dona Canô e ter direito à inauguração com presença de ministro e demais autoridades. O solar será reaberto como Casa do Samba, às 17 horas desta sexta. O ministro Gilberto Gil e o governador Jaques Wagner estão sendo esperados. Dona Canô, claro, garante a presença. Caetano Veloso vai participar, como informou a assessoria de imprensa do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

Ao todo, essa autarquia vinculada ao MinC investiu R$ 2 milhões do próprio bolso para evitar a perda total da edificação e dar a ela um uso, além de reduzir, no que fosse possível, o contraste estabelecido com a instalação do Teatro Dona Canô em 2001, no entorno do monumento tombado, que ocupou o quintal e alterou a tipologia arquitetônica da área. Agora, o Solar Subaé, como também é chamado, passa a ser do samba-de-roda, registrado como patrimônio pelo governo federal em 2004, e também reconhecido pela Unesco, um ano depois.

O arquiteto do Iphan, Francisco Santana, disse que só depende de conservação para que o monumento não volte a ficar arruinado. “Ninguém patrocinou, foi o Iphan mesmo que bancou”, diz Francisco. Segundo informou, foi tudo feito com tinta mineral, própria para contribuir para a absorção e a secagem ideais, sobre argamassa antiga à base de cal. O cuidado no restauro nesses casos é fundamental. “Para manter as características”, diz o arquiteto, que sai explicando cada passo dado. “A frente vai ficar em solo-cimento para o samba-de-roda. Tem esse projeto de iluminação. As árvores (altíssimas) ainda são as que foram plantadas pelo conde”, aponta. No chão, as pedras foram numeradas para poder voltar para o mesmo lugar. O mármore é sempre o original. Nas soleiras, o de Lioz, mesmo rachado, permaneceu.

Restauração – O piso do restaurante é uma tijoleira de barro cozido rústica que preservou a mesma paginação original. Portas de vidro servem como novas divisórias, contrastando com a idade da casa, que ganhou uma primeira reforma em 1859, com a iminência da visita do imperador dom Pedro II, que acabou não dormindo na casa. Foi aí que as abóbadas no térreo e o segundo piso foram feitos.  Todo o projeto, que recompôs, também, a volumetria da antiga senzala destruída, é de Francisco Santana, Etelvina Rebouças, Fernando Magno e Alexandre Prisco.

A equipe optou por conservar os antigos pilares que davam sustentação ao espaço, contrastando  com todos os elementos novos que serviram para reerguer a edificação. Da antiga senzala, uma passagem faz a interligação com o Teatro Dona Canô. O prédio anexo acomoda um estúdio de gravação e salas, também, para produção musical, com isolamento acústico e material elétrico modernos.

A preocupação de Francisco era que as paredes remanescentes ficassem evidentes. Ele tratou de guardar um caule retorcido de aroeira que tinha se enraizado e se desenvolvido por entre as paredes do solar. Francisco  acha que algum projeto futuro de memória ou de arte qualquer poderá aproveitá-lo. A pilastra que a aroeira desaprumou foi mantida do mesmo jeito: “A árvore inclinou o maciço de alvenaria que faz a interligação dos edifícios”.

No segundo piso, a inclinação é de uma parede inteira, da fachada frontal, provocada pelo desabamento do telhado. Essa contingência corrigida também ficará registrada, ou seja, a parede continuará torta. Quem olhar com cuidado perceberá. Na pintura, faixas azuis seguiram a moda da época, contornando o alizar (moldura) das portas e os rodapés, também, na cor ocre. A escadaria de madeira com balaustres e frades (espécie de adorno) torneados foi recuperada e poderá ser usada normalmente. Exclusivamente, para os portadores de deficiência física e idosos, foi integrado um elevador.

De todas as paredes com escaiole, que era aquele tipo de pintura que imitava o mármore, sobrou apenas um pedaço de 1,20 por 1 metro. Isso porque as paredes tinham ruído e tiveram que ser recompostas. A técnica usada para recuperação das pinturas artísticas também não estava resistindo à degradação. Há fragmentos dela no segundo piso, com partes quase apagadas ou substituídas por adornos de diversas fases.

Brasão – “A gente poderia recompor, mas o critério foi manter uma restauração, digamos assim, arqueológica, respeitando o que foi encontrado, sem fazer um falso histórico”, frisou Francisco. Prova disso é o brasão da família já meio esmaecido na parte superior da parede. Também a explicação sobre como foi salva a parede com o maior número de adornos pintados é digno de detalhamento: “Foi feito um sanduíche com madeira, formando uma trama de sustentação. Aí, suspendemos essa parede e depois retiramos a madeira original do barroteamento (estrutura de sustentação) e colocamos estruturas metálicas, arriamos a parede em cima e estabilizamos as outras, com estruturas metálicas embutidas”, assinala Francisco.

“Muita dificuldade, o casarão estava muito acabado”, murmura José Carneiro Mehlen, diretor da empreiteira que ganhou a licitação para restaurar o monumento em dezembro do ano passado. “Vencemos pelo menor preço”, disse. “Achei bonito, dá mais um toque na cidade. Estava muito feio”, disse a santamarense Alda Salles, de  55 anos, moradora da Rua João Soldado, que sabe sambar e deverá se aproximar da Casa do Samba no antigo Solar Subaé.

Publicações relacionadas

MAIS LIDAS